O peso do ar é o respirar de uma pedra.











A costa ao largo do Carvoeiro tem escarpas suaves e porosas, um cocktail desigual, onde marés elementares trocam fôlegos em conversas abrasivas:
O Fogo está exausto de uma noite longa e quente.
O Mar dá o seu passeio matinal à beira da praia.
A Rocha observa, descuidada, e perde uns trocos.
O Vento passa apressado, trazendo notícias.
Para o Vento: Faz diferença que mão cheia de poeira escolhemos dos teus pulmões? Toda a poeira te reencontra, todo o passado passa pela tua respiração.
Oiço-te, pesada, inchada de fumo denso, a ajudar Fogo a fazer o seu trabalho. Indiferente a que louco te contratou, a que idiota te excitou, que estúpido esperou lucrar por te alimentar, despiste diligentemente a terra para o crescer do ano que virá. Como saberias tu que nada de novo seria plantado?












Rosa: O meu corpo não tem opinião. Apenas exploro rochas, respiro vida para dentro de águas paradas, enquanto o mar está ocupado.
Enrolada na concha de arenito esculpida, uma criatura rosa desenrola os seus membros e traça formas curvas. Junta fragmentos quebradiços com uma curiosidade terna. O corpo-língua sonda todas as fendas para as provar, e ser provada.
A minha língua abana, vibra, e tenta moldar o ar numa mensagem para Vento. Seria bom ter uma língua que funcionasse, sabendo que posso perder detalhes. Uma linguagem gestual universal, entendida por humanos, não-humanos, vivos, e não-vividos. Gestos amplos seriam suficientes. Tento, mas não consigo, fazer deslizar uma pedra sobre a água.
“Eu gosto de gestos amplos.” Diz a Ana.
“Eu prefiro os detalhes.” Diz a Elisabetta.










No nosso espaço de trabalho, Ana desenha. Cada página é rapidamente preenchida de símbolos, num andamento pleno em adrenalina. Ocasionalmente, corta buracos no papel para que a próxima página possa começar antes de terminar a página onde está. Riscos e planícies de carvão, assentamentos de um rosa sólido. Os dedos-impressora da Ana rasgam e colam os pedaços do dia, como caracteres libertos; são mensagens para Vento e Fogo inspirarem.
As pessoas daqui vivem de livre vontade numa obscuridade geológica. As conchas sem conta que se encontram subterradas no arenito são testemunhas desta arenosa forma de vida. Vimos, numa capela, caveiras de monges embutidas nas paredes, como tijolos, desvalorizadas para agregar, tal como as conchas.















No cemitério vemos mais restos mortais encravados em superfícies pouco notáveis. O chão está ricamente coberto de flores de plástico. Plástico de origem fóssil. São as conchas, de volta para se mostrarem outra vez. Talvez nos venha a ser agradável sermos petróleo.
ESCUTE
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